«O casamento é a doação e aceitação recíproca de todo o ser pessoal entre um homem e uma mulher, para toda a vida, sejam quais forem as circunstâncias que se deparem no futuro.
A exigência deste compromisso é grande, visto que o futuro não está escrito e não se pode adivinhar. Mas essa incerteza, própria da natureza humana, não significa que as pessoas não possam exercer a capacidade de prometer e cumprir o que livremente prometeram.
A doação e aceitação recíprocas implicam a aceitação do outro tal como o outro é e não como gostaríamos que fosse, ou tal como é nas representações mentais que fazemos acerca dele. Trata-se de aceitar o outro tal como realmente é: as suas virtudes e defeitos, com as suas características positivas e negativas, a maneira diferente como se comporta, até as suas manias.
Convém ter presente que o outro é uma pessoa única, irrepetível, insubstituível, sem ninguém parecido, e que a sua singularidade não tem réplica.
A esse outro – cuja doação se aceita ou a quem se entrega a própria pessoa – nunca o chegamos a conhecer totalmente. A interioridade de cada pessoa é tão rica e criativa que não tem fundo. Conhecê-la perfeitamente é impossível, pois sempre encontraremos subterrâneos na personalidade do outro por onde o conhecimento mútuo não consegue abrir caminho (Yepes Stork, 1997).
Quanto mais se esforce uma pessoa por conhecer ou por comunicar com outra, tanto maior será a probabilidade de a conhecer realmente melhor. Mas um conhecimento total e completo do outro é impossível. Existem âmbitos e realidades nas pessoas que não são comunicáveis visto que não dispomos da linguagem necessária para transmitir aos outros o seu conteúdo (Polaino-Lorente, 2003).
Neste exercício da comunicação pessoal, todos temos que nos esforçar mais. Um bom conselho – tendo em conta o que acontece nos países mediterrânicos – poderia ser que, no âmbito da comunicação conjugal, o homem tem que falar mais e a mulher menos. 85% das mulheres espanholas casadas – segundo um estudo realizado há alguns anos – sublinhou que a incomunicação conjugal era o primeiro problema entre os casais. A maioria queixava-se de que os maridos não falavam. Também é verdade que, em certas ocasiões, a mulher fala tanto… que o homem nem consegue falar. Alguém escreveu – não sei com que verdade – que “a mulher quando fala descansa e o homem quando fala cansa”.
De qualquer modo, a comunicação entre o homem e a mulher é importante. Sem ela é quase impossível sustentar a vida do casal. De facto, muitos conflitos conjugais, que terminam em separação ou divórcio, começam por incomunicação conjugal (Polaino-Lorente, 2004).
A doação no casamento deve ser completa. O que um casal tem que dar mutuamente é a pessoa inteira – não só o corpo, embora também o corpo -, e na doação de toda a pessoa encontra-se a interioridade, a intimidade com os seus pensamentos, sentimentos, projectos, memórias, etc. O marido tem muitas coisas para dar à mulher se abrir a sua intimidade. A mulher receberá muitas coisas se as acolher com interesse e ternura, e não fizer ricochete com a informação que recebe. O mesmo sucede com a mulher a respeito do marido.
Num casal que viva unido, encontraremos uma comunicação conjugal fluida, simples e profunda. É importante que exista essa comunicabilidade entre as pessoas, pois o que é dado por cada um deles, através da comunicação, é precisamente o que os une e dignifica, o que confere à relação uma maior espessura e densidade, a ponto de serem uma só carne.
Pelo contrário, o que se não comunica separa; o que separa distancia; o que distancia afasta; e o que afasta rompe a unidade entre os cônjuges. A construção da fidelidade conjugal passa pela comunicação. Se a comunicação conjugal não funciona, é sempre possível que se abra um espaço entre eles, por onde pode por desgraça aparecer um “terceiro” ou uma “terceira”, ameaça que pode romper o vínculo sagrado de amor e compromisso que havia entre cônjuges.»
(Aquilino Polaino-Lorente, Catedrático de Psicopatologia, Universidade San Pablo-CEU, Madrid. Conferência em Setúbal - Março de 2008)
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