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RIO - Nas maternidades particulares da cidade do Rio, praticamente
não nascem mais crianças de parto normal. Segundo a Secretaria municipal
de Saúde, 93% dos partos realizados nos hospitais privados são
cesarianas, quando a Organização Mundial de Saúde recomenda que esse
percentual não ultrapasse os 15%. Já nas unidades públicas do município,
o índice é de 36%. Com isso, a capital tem, juntando maternidades
particulares e públicas, 57% de cesarianas, contra 52% em todo o Brasil.
Entre
os hospitais públicos do município, a Maternidade Maria Amélia Buarque
de Hollanda, no Centro, é a que tem a menor taxa de cesarianas da
cidade: 18%. Inaugurada em maio de 2012, a unidade já é referência e tem
atraído até grávidas com planos de saúde. Após uma experiência
traumática no nascimento do primeiro filho, hoje com 5 anos, a arquiteta
Ana Karina Costa Amaral, de 36 anos, abandonou a médica do plano de
saúde, já na 41ª semana de gestação, para ter a pequena Luiza na nova
maternidade.
— A médica pediu dinheiro por fora para acompanhar o
meu trabalho de parto. Chegamos a aceitar, mas no final da gestação ela
disse que a criança estava muito alta e que a cesariana seria
necessária. Nunca mais voltei ao consultório dela, e minha filha nasceu
de parto normal, no hospital público, com 42 semanas de gestação, sem
qualquer problema — contou.
O tema preocupa especialistas e ganhou
as telas de cinema. Em cartaz desde agosto, o filme “O renascimento do
parto”, de Érica de Paula e Eduardo Chauvet, retrata o número alarmante
de cesarianas no Brasil e mostra as consequências clínicas e
psicológicas para os bebês, que cada vez mais nascem prematuros. Através
de relatos de especialistas na área, o longa promove uma reflexão sobre
o futuro de uma civilização nascida sem os chamados “hormônios do
amor”, liberados, segundo médicos, apenas em condições específicas do
trabalho de parto.
Médico alerta para perigos da prematuridade
Especializado
em neonatologia, o pediatra José Vicente de Vasconcelos, da Maternidade
Leila Diniz, na Barra da Tijuca, alerta que a prematuridade provocada
pela cesariana pode causar problemas respiratórios no bebê. A OMS
considera prematuras crianças que nascem antes de 37 semanas completas —
e é comum o agendamento de cesarianas já a partir da 37ª semana.
—
A prematuridade leva a muitos riscos, como o de doenças respiratórias,
que podem exigir internação e afastar a mãe do bebê. Ele demora mais
para começar a se alimentar. Além disso, há o perigo de infecção
hospitalar. O trabalho de parto é importante porque o bebê, quando passa
pelo canal de parto, elimina o excesso de líquido dos pulmões. Na
cesariana, isso não acontece. O bebê nasce cheio de líquido nos pulmões
e, muitas vezes, tem dificuldade para respirar. São muitos os riscos,
mas infelizmente temos uma epidemia de cesarianas, que só deveriam ser
adotadas quando há perigo para a mãe e a criança — alerta.
Aline Sudo, consultora de amamentação, conta que bebês que nascem de cesariana apresentam mais dificuldades para mamar no peito:
—
No parto normal, o bebê já está pronto para começar a mamar na hora em
que nasce. Na cesariana, como é marcada, muitas vezes o bebê ainda não
está pronto e pode ter algum transtorno na hora de fazer contato com a
mãe.
O índice de cesarianas em todo o estado chegou a 62% em 2012.
Subsecretária de Atenção à Saúde da Secretaria estadual de Saúde, a
médica sanitarista Mônica Almeida disse que o problema muitas vezes é
provocado pela falta de leitos de maternidade, principalmente na Baixada
Fluminense.
— O médico, então, é obrigado a marcar dia e hora,
para não correr o risco de, na hora do parto, não haver vaga para a
paciente — contou.
Após uma experiência traumática em duas
cesarianas, Júlia Araújo dos Santos, de 23 anos, moradora de Duque de
Caxias, decidiu buscar atendimento na maternidade carioca Maria Amélia
Buarque de Hollanda.
— Uma amiga indicou esta maternidade e disse
que o atendimento é igual ao de hospital particular. É o meu primeiro
dia aqui, mas já percebi que é muito melhor do que lá perto de casa —
comentou Júlia, que está com 39 semanas de gravidez.
O secretário
municipal de Saúde, Hans Dohmann, reconhece que ainda há casos de
grávidas que peregrinam em busca de atendimento, mas afirma que são
pacientes de outros municípios. Segundo ele, o projeto Cegonha Carioca
tem conseguido assegurar o atendimento às gestantes da capital. Sobre os
altos índices de cesariana, o secretário destacou que a decisão
“soberana e legítima é sempre do médico”.
— Ainda temos um espaço
para caminhar até alcançar as recomendações da Organização Mundial de
Saúde, mas já estamos próximos. Um trabalho de educação dos
profissionais de saúde e das gestantes, que muitas vezes preferem a
cesariana, é que vai nos aproximar das recomendações — acredita.
De
acordo com a vice-presidente do Cremerj, a obstetra Vera Ferreira, o
médico marca a data para garantir a internação, inclusive porque há
falta de leitos também na rede privada:
— Nos municípios menores, o
problema é a fala de profissionais, e os médicos acabam marcado
cesariana nos dias em que têm certeza de que a equipe estará completa.
Outra questão é a baixa remuneração. Um parto normal demora em média 12
horas, e o profissional recebe cerca de R$ 300 para acompanhar todo esse
tempo e os dias seguintes. Fora isso, tem o próprio desejo da mulher de
fazer cesariana. O Cremerj não defende isso e tem a preocupação de
sempre informar que o parto normal é a primeira via.
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